Quando me proponho a escrever sobre Todd Solondz ou rever seus trabalhos sempre me questiono: como alguém consegue ser tão persuasivo? Sarcasmo e humor negro não são o suficiente, há algo além.
Na última vez que analisei um de seus filmes, eu disse o seguinte: “seus trabalhos são o preto no branco do desejo”. Agora, em Palíndromos | Palíndromes – 2004 | esta proposição novamente se confirma, pois o próprio filme se inicia a partir do desejo de uma menina, ainda criança, em ser mãe. Este desejo será apresentado sem máscaras, desprovido de qualquer brilhantismo ou idealização. Antes de mais nada, há uma sutileza já presente no título: palíndromo é um termo atípico mas bastante compreensível que diz respeito à frases ou palavras que mantém o mesmo sentido quando lida de trás pra frente. Há uma listinha super no Wikipédia.
Um palíndromo mostra que independente da ordem, há a prevalência do mesmo. A menina que desejava ser mãe chamava-se Aviva, e esta denotação do seu nome traria todo significado à mensagem que o diretor pretendia expor por meio de diferentes atrizes que representariam Aviva, cada uma em uma fase específica. Aos seis anos Aviva desejava ser mãe, o seu discurso já evidenciava tal desejo e aos 13 anos este se mantinha de tal modo que ela engravidou.
Um abalo para seus pais, no mínimo. Estes se pautaram na seguinte concepção: ela é incapaz de exercer esta função. Com base em diálogos frios e realistas, Todd aborda a problemática do aborto como modo de sustentação do desejo dos pais.
Na impossibilidade em chegar a um acordo, este aborto ocorreu a partir da intervenção dos pais, o qual não apenas retirou aquela criança, mas privou Aviva de uma futura gestação. Podemos pensar que já havia uma identificação entre Aviva e o bebê, uma relação libidinal já estabelecida desde a infância e sua retirada foi certamente tida como dano, ocasionando uma sensação de desorganização interna. Esta ação repressora retirou o bebê porém o desejo permaneceu, o qual a conduziu à novos rumos ilustrando a típica cena da adolescente que sai de casa, mas com resultados além do esperado.
Esta fuga a fez aproximar-se de pessoas com as quais acreditava ser capaz de encontrar um novo vínculo. Há uma brincadeira com o acaso que se apresenta pela desorientação daquela jovem, fazendo-a caminhar numa estrada sem rumo, relacionar-se sexualmente com um estranho e localizar um abrigo. À cada fato descrito apresenta-se uma nova atriz, porém trata-se da mesma Aviva. O seu humor deprimido parece representar uma falta não simbolizada, pois a verdade de seu desejo não havia sido expressa.
Um encontro bastante sutil ocorreu ao localizar o abrigo “Mama Sunshine”, uma espécie de reformatório cristão para crianças com algum tipo de déficit físico ou cognitivo. Este ficava próximo à um terreno baldio no qual bebês eram ejetados e a missão acreditava que no encontro com o Divino seria-lhes dado um novo significado para suas vidas. Eu acho interessante que há relatos de casos de crianças que seriam abortadas mas por algum motivo, vieram a nascer. Com base nas deformidades recorrentes do nascimento pode-se ver que o diretor não pretende justificar ou repudiar tal prática, mas mostrar os possíveis desdobramentos da decisão de ter um filho. Todd também questiona o modelo americano que busca construir “cidadãos melhores” e os meios usados para isso, apresentando que as vias repressoras potencializam “quadros iguais” por não existir espaço para reflexão.
Neste trajeto Aviva encontrou novas fontes repressoras assim como se deparou com a hipocrisia humana e a falência do poder religioso em sua tentativa de retirar o desejo daquele que tem falta.
Há um palíndromo que está bastante claro e o tempo todo se apresenta neste filme: reviver. O sujeito busca constantemente REVIVER o seu desejo, ainda que por meio de diferentes faces, de trás para frente a situação é a mesma. O desejo em ser mãe pode ser compreendido a partir deste reviver que consiste numa compulsividade à repetição na qual será revivido as experiências sexuais infantis, mesmo aquelas sob ação de recalcamento/ repressão. Freud levanta a hipótese de que o desejo da menina em ser mãe se desenvolve a partir da maneira com ela vivencia a percepção da diferença dos sexos e sua condição de falta, neste pensamento um bebê vem a suprir esta ausência e trás um atributo fálico (poder) à mulher.
Há um palíndromo que está bastante claro e o tempo todo se apresenta neste filme: reviver. O sujeito busca constantemente REVIVER o seu desejo, ainda que por meio de diferentes faces, de trás para frente a situação é a mesma. O desejo em ser mãe pode ser compreendido a partir deste reviver que consiste numa compulsividade à repetição na qual será revivido as experiências sexuais infantis, mesmo aquelas sob ação de recalcamento/ repressão. Freud levanta a hipótese de que o desejo da menina em ser mãe se desenvolve a partir da maneira com ela vivencia a percepção da diferença dos sexos e sua condição de falta, neste pensamento um bebê vem a suprir esta ausência e trás um atributo fálico (poder) à mulher.
O reviver presente no filme pressupõe um ciclo constante, mas também a relação com o mesmo, ou seja, ausência de transformação. Este fato mostra que as ações repressoras foram ineficazes, pois mesmo com a perda do objeto, o desejo não foi retirado e iria se manifestar de outros modos. A sensação de não chegar a lugar algum assemelha-se ao resultado das ações repressoras que alienam o sujeito da verdade de seu desejo. É justamente esta falência que Todd nos aponta. Assim, é como um desmoronamento da potência religiosa, social e política que tem constantemente falhado em sua tentativa de “construir cidadãos melhores”.
Renato Oliveira
29 comentários:
bela postagem.. criativa,..
Bjs
Insana
Cara que filme !
Não sabia nem da existência dele, mas que história louca é essa ?! rs
Perfeito. Agora estou SUPER doido pra ver esse fime ! xD
preciso conhecer os trabalhos do Todd! agradou-me! bj.
Oi Renato,
Eu estava aguardando um post novo seu para comentar. Acabo de chegar em casa e o vejo, enfim.
Fico feliz pelo fato de você fazer esse agrado para mim. Obrigada de coração, mesmo...!!
Renato, vou voltar aqui para ler esse seu post e, após, comentá-lo. Geralmente, costumo deixar você para depois, quando não me encontro em situação de dar a devida atenção. Como já sabe, gosto de suas críticas, então, faço questão de ler com cuidado.
Beijos,
Renaaaaato...como sempre MARAVILHOSO post, já disse que sou sua fã? ahsuahsaushaush
PS:Acho uma falta de respeito não conheceres Dostoiévski...kkkkkkkkkkkk
bjinhus *-*
Prezado
Boa noite!
Legal seu blog.
Abcs
Alexandre Taleb
Consultor de Imagem
Blog: http://ataleb.wordpress.com/
Oi Renato, tudo bem?
Menino, esse filme parece ser ótimo, eu já estou me vendo chorando ao assiti-lo, kkkkkkkk
Sou todo emotivo, daí já viu hahahha
Ah, temos q seguir sempre em frente mesmo.
Tem post novo lá, rs
Abraços
:)
Mais uma indicação maravilhosa,
sinto necessidade de vir até aqui!
parabens.
Mais um filme que ainda não assisti...
De qualquer forma, grande escrito.
Medo de ver o filme e não enxergar nada do que vc escreveu...
Oi Renato,
Minha nossa, que filme!! Sinceramente, que ciclo perturbador dessa criança. Imagino como seja esse filme, por meio dessas suas palavras.
Beijos,
oi henrique, obrigada por me seguir :D
viu a novidade das quartas? gostou? :) haha
ah, seus postas são muito grandes, e agora não estou com tempo de ler, mas assim que eu poder eu venho apreciar aqui! beeijos ;**
oowwn o filme me interessou! ^^
brigado pela visita!
abraçooo'
Gosto do cara, mas nunca pensei em citá-lo quando alguém me pergunta de filmes preferidos. Sei lá, acho que falta entender a energia do mesmo. Espero um dia acontecer.
Ps: Me deu um apertozinho no peito em saber que não tem nada do Almodóvar na sua lista de filmes preferidos, rs.
Tudo bonito aqui, bem dito, bem cuidado. Digno.
O filme parece ser ótimo, vc é muito criativo no quê escreve. Parabéns;
Parabéns pelo seu blog, realmente excelente!
Abraço forte!
Este guri escreve e analisa muuuito bem: parabéns, meu querido!
Bjkas, muitas!
Adoro o seu blog!!
Gosto de filmes que querem nos dizer algo e sempre encontro boas dicas aqui.
Visite meu blog mais vezes!
Até mais
Si mplesmente
Renato,
Devo repassar o premio dardos a 15 blogs que mais curto...sei que não é muito a cara do cine freud,mas preciso homenageá-lo pelos excelentes textos.
Parabéns!!!!O selo premio dardos é seu.
Abços
“seus trabalhos são o preto no branco do desejo”.
Tens razão. Perfeito.
Renato, só posso dizer isto: PERFEITO!!!
Já reparou que fazer análise é algo palíndromo? Vivemos a nossa vida de trás para frente. 'Ah, o cara é daquele jeito porque sofreu isto na infância, ou aquilo na adoslecência', ou qualquer coisa assim...
Quando vamos falar algo e dizer pronto, aconteceu e não procurar explicações? Quando?
No final sempre resta o desejo, né?
Beijos
Adivinha? Pra variar, minha curiosidade foi aguçada! Encantei-me pela sua crítica sincera e transparente. Belo post.
*Obrigada pelo comentário no meu blog! Sinto que deixamos que o mundo nos influencie de forma negativa, nos transformando em insensíveis, e aí se encontra o porquê de tanto descaso. Volte sempre [adoro suas observações sobre meus posts!]!
Abraços!
Sempre nos surpreendendo!
Parabéns pela ótima resenha!!!
Bjs!!!
Muito rica sua análise. Parabéns!
Beijos.
...traigo
sangre
de
la
tarde
herida
en
la
mano
y
una
vela
de
mi
corazón
para
invitarte
y
darte
este
alma
que
viene
para
compartir
contigo
tu
bello
blog
con
un
ramillete
de
oro
y
claveles
dentro...
desde mis
HORAS ROTAS
Y AULA DE PAZ
TE SIGO TU BLOG
CON saludos de la luna al
reflejarse en el mar de la
poesía...
AFECTUOSAMENTE
CINE FREUD
ESPERO SEAN DE VUESTRO AGRADO EL POST POETIZADO DE CHOCOLATE, EL NAZARENO- LOVE STORY,- Y- CABALLO, .
José
ramón...
Oi Renato!
Obrigada pelas boas vindas. Realmente tive de me ausentar, mas, agora estou de volta. Como vc não poderei mais me dedicar ao blog tanto como gostaria, pois minhas responsabilidades me tomam um certo tempo. Porém, na medida do possível, manterei minhas postagens atualizadas e farei visitar a alguns blogs que gosto e o seu é um deles.
Acho bem interessante a forma como vc aborda um determinado filme. Seu olhar e sua percepção sobre ele é bem diferente do meu e gosto disso, idéias e visões opostas de certa forma pára mim se complementam.
Em relação ao filme "Sabrina" (como vc sou fã da Audrey Heppburn e adoro todos os seus filmes), gostei muito de sua abordagem e a forma como vc descreveu a personagem dela. Muito bom mesmo.
Quanto a este filme "Palíndromo", confesso que nunca tinha escutado falar nele e ´sua descrição da trama me instigou a vê-lo. Espero que o encontre aqui na minha terra, pois o tema é interessantíssimo. So mesmo depois de ver para expressar o que achei.
Torça para que eu o encontre.
Um beijinho carinhoso.
Realmente criativo e seu blog virou para mim, um RADAR de dicas para saber sobre filmes a serem vistos.
BeijooO'
Renato,
Achei fantástica a descrição do filme e a maneira como você relaciona as coisas com a teoria psicanalítica. Muito, muito bom!!
O infantil sempre irá permanecer conosco. Além de tudo, o bebê que fomos não morre jamais.
Abraços.
Трогательная статья, как долго ожидать публикации свежего материала и вообще стоит ожидать ?
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